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Para onde o mundo vai

Na corrida das entregas aéreas, drone do Google sai na frente da Amazon

Mônica Matsumoto

13/06/2019 04h00

Por Monica Matsumoto

O serviço de entrega por drones está bem próximo de acontecer. Além de usar os tradicionais vans e carros, a Amazon anunciou em sua conferência re:MARS (EUA) que dentro de poucos meses iniciará a entrega de pacotes por drones para clientes Prime Air.

Ao escolher o produto no site da Amazon, o cliente pode ter seu pedido entregue tão rápido quanto 30 minutos. Acalmando o senso de urgência dos clientes, certamente a Amazon irá conquistar mais consumidores.

Imagine a facilidade de ter em poucos minutos um petisco que faltou do supermercado. Ou comprar um presente de última hora (por exemplo, no dia dos Namorados) e receber antes de sair para o encontro. As possibilidades são vastas.

Figura 1. Lançamento do último modelo de drone de entrega da Amazon. Fonte: Amazon.

Entenda as especificações do drone anunciado pela Amazon:

  • Peso máximo do pacote: 2,2 kg**
  • Distância máxima de vôo: 24 km
  • Tempo máximo de entrega do pacote: 30 minutos
  • Decisão autônoma de abortar o vôo: Drone pode decidir interromper o vôo, retornar à base e não fazer a entrega
  • Pouso: vertical como helicópteros
  • Vôo com 6 graus de liberdade: subir ou descer, rolar para direita ou esquerda, e ir para trás ou para frente
  • Vôo dito eficiente e aerodinâmico como um avião
  • Sensores: combinação de câmeras termais, de profundidade e sonar
  • Visão computacional: métodos avançados de IA para navegação e pouso seguros, especialmente para evitar fios (telefone, energia, varal)
  • Pegada de carbono: uso de baterias elétricas recarregáveis, além de evitar emissão de poluentes por veículos terrestres
  • Local de estréia: ainda não revelado pela Amazon.

(** A carga de 2,2 kg pode parecer pouco, mas a Amazon afirmou que ao menos 75% dos itens comprados estão abaixo deste peso)

A dificuldade não é fazer o drone voar

Desde o primeiro anúncio da Amazon, em dezembro de 2013 até o momento, passaram-se mais de cinco anos. Por que esse projeto demorou tanto para se concretizar?

Cada item descrito acima, traz requerimentos de engenharia ao projeto: bateria elétrica, capacidade de carga, autonomia, sensores… todos com muitos obstáculos de execução. Entretanto, esse não é o maior desafio de fazer um drone voar e entregar um pacote!!!

Por incrível que pareça, o maior desafio vem das exigências dos órgãos reguladores: a certificação da aeronave e o controle do espaço aéreo. Para o bem, deixemos claro.

Veja os exemplos recentes de acidentes com helicópteros em Nova Iorque (NYC). Na semana passada, um helicóptero colidiu com a cobertura de um prédio, e uma pessoa morreu nesse acidente. Outros acidentes com helicóptero em NYC aconteceram por colisão com aeronave, ou pouso forçado no rio Hudson. Isso acontece num espaço aéreo regulado, numa cidade com alta densidade populacional.

Figura 2. Vôo turístico de helicóptero em Nova Iorque. Fonte: Wildluxe.com

Agora, imagine um drone ou muitos deles, fazendo entregas em zonas urbanas. O veículo aéreo drone é bem similar ao helicóptero, porém de menor porte. Existe a chance de colisão com pássaros e aviões, por exemplo. Ou, ainda, existe chance de queda sobre pessoas e animais, em cidades e também no campo. Note que, dentro da regulação atual, o uso de drones comerciais em zonas urbanas é proibido.

Nos Estados Unidos, essas normas de certificação de aeronaves e do espaço aéreo são definidas pelo FAA (Administração Federal de Aviação). Dentre as regulações, os drones não podem circular perto de aeroportos, nem sobrevoar regiões com pessoas ou animais. Os veículos aéreos não podem pousar em veículo em movimento nem ser operados por pessoas neles. Além disso, o drone tem operação limitada a 400 pés de altura (120 metros).

No Brasil, quem regula as certificações é a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) e o espaço aéreo, o DECEA (Departamento de Controle do Espaço Aéreo). As normas brasileiras para drones seguem o padrão internacional da FAA.

Outro fator crítico, além da circulação de veículos aéreos, é a certificação das aeronaves. Os drones têm que satisfazer uma série de requerimentos de aerodinâmica, controle de falhas, controle de riscos de colisão e queda, que passam por um crivo rigorosíssimo das agências reguladoras.

Um exemplo de ponto fraco para a certificação de drones é que nenhum avião é certificado para colidir com segurança com um objeto metálico (como o drone). E aviões transportam pessoas, e a segurança física delas está em primeiro plano.

Google (Alphabet) está na frente

Apesar de todas as normas acerca dos drones, em abril deste ano foi certificado o primeiro drone de entregas pela FAA. Trata-se do drone Wing, da empresa Alphabet (empresa-mãe do Google). A empresa já pode operar como empresa comercial de aviação e inicia sua primeira operação na zona rural no estado da Virgínia (EUA).

Isso mostra a forte competição na área e também que a Alphabet está agora à frente, desbravando o espaço mais difícil, que é o da regulação.

Assim que a Amazon lançou seu último modelo de drone na semana passada, a FAA anunciou um waiver (dispensa de obrigações) que permite a Amazon testar seu modelo –assim como dezenas de outras empresas tem permissão, porém sem certificação. Entretanto, a Secretária de Transporte Americana (Elaine Chao) já acenou que possíveis mudanças como voar sobre pessoas podem ocorrer para agilizar a inovação nessa área de negócios.

Considerações finais

Não irá demorar muito para os primeiros pacotes serem entregues de forma operacional. Essa facilidade irá impactar o comportamento de consumo, pois a comodidade libera espaço para outras atividades. As tarefas simples terão um atalho, e diminuirá nesse aspecto a necessidade de locomoção.

Não demorará também para o mercado de trabalho sofrer os impactos dessa mudança. Empresas de entrega, serviço de atendimento em lojas e supermercados, entre outros, terão redução de volume e será necessário outro foco de operação.

Todas essas mudanças são inevitáveis. A entrega por veículos aéreos, se for adotada pelo mercado, será apenas um fator a mais para mudanças e futuro do trabalho, sobre o consumo e as adaptações da sociedade cada vez mais digital.

Veja ainda os vídeos do drone da Amazon e Google (Wing):

Sobre os autores

Daniel Schultz é cientista, professor de microbiologia e membro do núcleo de ciências computacionais em Dartmouth (EUA). Estuda a dinâmica dos processos celulares, com foco na evolução de bactérias resistentes a antibióticos. É formado em engenharia pelo ITA, doutor em química pela Universidade da Califórnia San Diego e pós-doutorado em biologia sistêmica em Harvard. Possui trabalhos de alto impacto publicados em várias áreas, da física teórica à biologia experimental, e busca integrar essas várias áreas do conhecimento para desvendar os detalhes de como funciona a vida ao nível microscópico.

Monica Matsumoto é cientista e professora de Engenharia Biomédica no ITA. Curiosa, ela tem interesse em áreas multidisciplinares e procura conectar pesquisadores em diferentes campos do conhecimento. Monica é formada em engenharia pelo ITA e doutora em ciências pela USP, e trabalhou em diferentes instituições como InCor/HCFMUSP, UPenn e EyeNetra.

Shridhar Jayanthi é Agente de Patentes com registro no escritório de patentes norte-americano (USPTO) e tem doutorado em Engenharia Elétrica pela Universidade de Michigan (EUA) e diploma de Engenheiro de Computação pelo ITA. Atualmente, ele trabalha com empresas de alta tecnologia para facilitar obtenção de patentes e, nas (poucas) horas vagas, é um estudante de problemas na intersecção entre direito, tecnologia e sociedade. Antes disso, Shridhar teve uma vida acadêmica com passagens pela Rice, MIT, Michigan, Pennsylvania e no InCor/USP, e trabalhou com pesquisa em áreas diversas da matemática, computação e biologia sintética.

Sobre o blog

Novidades da ciência e tecnologia, trazidas por brasileiros espalhados pelo mundo fazendo pesquisa de ponta. Um espaço para discussões sobre os rumos que as novas descobertas e inovações tecnológicas podem trazer para a sociedade.