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Para onde o mundo vai

Para onde caminha a energia solar

Mônica Matsumoto

24/05/2018 04h08

Por Diogo Volpati

Imagem: compoundsemiconductor.net

Em um dia ensolarado nos sentimos quentes porque absorvermos parte da energia abundante que vem do sol, chamada de energia eletromagnética. O dispositivo que discutiremos aqui também absorve parte dessa energia eletromagnética e a converte diretamente em energia elétrica por meio de efeito fotovoltaico. Daí o nome; célula fotovoltaica, ou célula solar. O efeito fotovoltaico foi reportado pela primeira vez em 1839 pelo físico francês Edmond Becquerel, mas somente em 1954 os cientistas Daryl Chapin, Calvin Fuller e Gerald Pearson apresentaram a primeira célula a base de silício capaz de fazer funcionar um aparato – no caso, uma miniatura de roda gigante. O principal desafio tecnológico à viabilidade de células fotovoltaicas é a melhora de sua eficiência, que pode ser sucintamente definida como a porcentagem da energia eletromagnética irradiada sobre a célula que é convertida em energia elétrica. Esse conceito de eficiência é importante para entendermos os avanços tecnológicos do setor.

A produção de energia elétrica é necessária para suportar os avanços tecnológicos e o aumento populacional, e a Agência Internacional de Energia estima que o mundo precisa aumentar sua produção energética em 30% para atender a demanda de 2040. Nesse cenário, os fotovoltaicos se tornaram atrativos especialmente por dois motivos. Primeiro, porque é fonte de energia limpa. O tempo de retorno do investimento energético, que define o tempo necessário para o fotovoltaico produzir a mesma quantidade de energia consumida na sua fabricação, varia entre 1 e 2,5 anos na Europa, comparados aos mais de 30 anos de vida útil do dispositivo. Segundo, porque os custos de produção dos painéis não param de despencar, o que torna a sua produção de energia elétrica cada vez mais atraente.

Atualmente, o silício é o material dominante no mercado de fotovoltaicos, com participação de 93% do que é produzido. Os investimentos em pesquisa do silício que alavancaram a indústria eletrônica também beneficiaram a indústria fotovoltaica, auxiliando na queda constante dos custos de produção e tornando essa tecnologia disponível para o uso residencial. O preço médio da produção de painéis caiu de 100 dólares/watt no começo dos anos 1970 para valores que hoje flutuam perto de 0.30 dólares/watt. Enquanto o barateamento dos painéis fotovoltaicos é o principal fator para tornar a tecnologia atrativa e viável para aplicações residenciais, a eficiência e durabilidade dos painéis fotovoltaicos são ainda os aspectos mais importantes para aqueles que projetam enviar um satélite para o espaço.

E para onde vai o mundo dos fotovoltaicos? Mesmo o silício dominando massivamente a indústria de painéis fotovoltaicos dentre tantas tecnologias disponíveis, sua eficiência de conversão está teoricamente restrita a 29.4% e na prática limitada a 26.7% nos laboratórios. Na indústria, os melhores painéis comerciais oferecem 22% de eficiência de conversão. Para atingir as demandas de 2040, os centros de pesquisa do setor têm trabalhado principalmente em duas frentes para superar esses limites; tanto utilizando materiais mais baratos como alternativa aos semicondutores convencionais, quanto aumentando a eficiência dos fotovoltaicos tradicionais.

Na busca de materiais mais baratos, pesquisadores têm focado em tecnologias emergentes como fotovoltaicos orgânicos e dispositivos de CIGS (Cobre-Índio-Gálio-Selênio) para diminuir drasticamente o custo de produção e ainda assim atingir uma eficiência razoável com os painéis fotovoltaicos. Apesar de serem tecnologias emergentes, diversas empresas já produzem e comercializam esses dispositivos fotovoltaicos, e a viabilidade econômica já está sendo testada em nichos específicos do mercado. Contudo, a eficiência e estabilidade desses fotovoltaicos ainda precisam ser melhoradas.

Na busca de alta eficiência com pequeno aumento dos custos de produção, os fotovoltaicos com concentradores de luz (CPV) são alternativa atraente e tendência atual, onde o uso de lentes econômicas para concentrar a luz em pequenas células fotovoltaicas permite reduzir a área do dispositivo, e assim tornar viável o uso de materiais mais caros com alta eficiência de conversão.

Em outro caminho, o limite dos painéis de silício pode ser superado aplicando o conceito de fotovoltaicos de múltiplas junções, que combina a célula de silício com outra célula fabricada com materiais que absorvem a parte de energia eletromagnética "descartada" pelo silício. Nessa abordagem a absorção de energia eletromagnética do sol é ampliada, o que aumenta a eficiência do fotovoltaico. Esse conceito foi apresentado recentemente por pesquisadores do Fraunhofer Institute for Solar Energy Systems ISE onde três células solares de silício, arseneto de gálio (GaAs), fosfeto de gálio e índio (GaInP) foram combinadas em um único fotovoltaico com eficiência de conversão de 33%. Entretanto, o caminho para a comercialização residencial dessas células é demorado porque os custos da fabricação dos filmes de GaAs e do GaInP ainda são altíssimos para escala industrial. Para amenizar os custos desses fotovoltaicos de múltiplas junções, pesquisadores na Suécia propõem membranas fabricadas a partir de nanofios de GaAs num processo chamado de Aerotaxy®. Ao invés de usar um filme plano de GaAs, um arranjo periódico de nanofios é capaz de produzir a mesma eficiência fotovoltaica com cerca de 1/10 do material.

Seja qual for o tipo de tecnologia dominante nos painéis fotovoltaicos daqui a 30 anos (fotovoltaicos de múltiplas junções, ou com concentradores de luz, ou mesmo as tecnologias emergentes), essa fonte de energia renovável será muito importante no futuro das matrizes energéticas. Em todo o mundo pesquisadores e empresas trabalham para tornar essa forma de geração de energia elétrica mais eficiente, mais barata e mais acessível. Os custos de fabricação e o desempenho final da célula fotovoltaica ainda guiam os avanços tecnológicos do setor, e essas novas tecnologias levam tempo para serem colocadas no mercado. Começamos falando das descobertas de Edmond Becquerel em 1839, e hoje (após 180 anos!) podemos ter no nosso telhado um painel capaz de gerar a energia elétrica necessária para acessar este texto na internet. E em breve ficará ainda mais barato, principalmente com mais ciência e tecnologia.

 

Sobre o autor: Diogo Volpati é cientista na área de nanoestruturas e filmes finos. É físico e doutor em Ciência dos Materiais pela UNESP de Presidente Prudente-SP, com pós-doutorados na USP, Universidade de Durham (Reino Unido) e Mittuniversitetet (Suécia). Desenvolve trabalhos na área de espectroscopia vibracional e eletrônica aplicados à diversas frentes tecnológicas; novos materiais para computação não-convencional, biointerfaces e biosensores. Atualmente integra uma startup em Lund-Suécia com foco na produção de membranas a base de nanofios para aplicações em fotovoltaicos de múltiplas junções.

Sobre os autores

Daniel Schultz é cientista, professor de microbiologia e membro do núcleo de ciências computacionais em Dartmouth (EUA). Estuda a dinâmica dos processos celulares, com foco na evolução de bactérias resistentes a antibióticos. É formado em engenharia pelo ITA, doutor em química pela Universidade da Califórnia San Diego e pós-doutorado em biologia sistêmica em Harvard. Possui trabalhos de alto impacto publicados em várias áreas, da física teórica à biologia experimental, e busca integrar essas várias áreas do conhecimento para desvendar os detalhes de como funciona a vida ao nível microscópico.

Monica Matsumoto é cientista e professora de Engenharia Biomédica no ITA. Curiosa, ela tem interesse em áreas multidisciplinares e procura conectar pesquisadores em diferentes campos do conhecimento. Monica é formada em engenharia pelo ITA e doutora em ciências pela USP, e trabalhou em diferentes instituições como InCor/HCFMUSP, UPenn e EyeNetra.

Shridhar Jayanthi é Agente de Patentes com registro no escritório de patentes norte-americano (USPTO) e tem doutorado em Engenharia Elétrica pela Universidade de Michigan (EUA) e diploma de Engenheiro de Computação pelo ITA. Atualmente, ele trabalha com empresas de alta tecnologia para facilitar obtenção de patentes e, nas (poucas) horas vagas, é um estudante de problemas na intersecção entre direito, tecnologia e sociedade. Antes disso, Shridhar teve uma vida acadêmica com passagens pela Rice, MIT, Michigan, Pennsylvania e no InCor/USP, e trabalhou com pesquisa em áreas diversas da matemática, computação e biologia sintética.

Sobre o blog

Novidades da ciência e tecnologia, trazidas por brasileiros espalhados pelo mundo fazendo pesquisa de ponta. Um espaço para discussões sobre os rumos que as novas descobertas e inovações tecnológicas podem trazer para a sociedade.